Direitos Reprodutivos: laqueadura e vasectomia no Brasil

Por Michelle Werneck - Advogada | 24/04/2024

Os direitos reprodutivos femininos e masculinos sempre foram alvos de polêmicas, principalmente em relação a idade e a necessidade de autorização do cônjuge para se fazer uma cirurgia, visando o controle de natalidade.

No Brasil tínhamos a Lei nº 9.263/1996 que estabeleceu o planejamento familiar como um direito e deu visibilidade a questão sexual e reprodutiva nos serviços de saúde em todo o país, dando destaque a contracepção. Porém o texto da Lei era engessado e permitia a realização da laqueadura e vasectomia a partir dos 25 anos de idade e com o consentimento de ambos os cônjuges, o que suprimia o direito de decisão sobre o próprio corpo e escolhas sobre ter ou não filhos.

Essa Lei pioneira sobre planejamento familiar fora revogada pela Lei nº 14.443/2022 dando mais autonomia para que homens e mulheres tenham o controle e direito de decisão sobre a sua vida reprodutiva. A partir de sua vigência a vasectomia e laqueadura passou a ser permitida para maiores de 21 anos e sem a necessidade de autorização e anuência do cônjuge.

O ponto de destaque da Lei é certamente a alteração da idade de 25 para 21 anos, e a não obrigatoriedade de ter filhos, ou seja, um homem ou mulher maior de 21 anos mesmo que não tenham filhos, poderão fazer o procedimento como controle de natalidade, anteriormente a Lei trazia a idade de 25 anos ou dois filhos vivos.

Outro marco estabelecido pela Lei nº14.443/2022 é a possibilidade de a mulher realizar a laqueadura logo após o parto, assim não precisando submeter-se a dois procedimentos cirúrgicos, além do controle de natalidade, visou diminuir os riscos de a mulher passar por duas cirurgias. Essa decisão de fazer a laqueadura logo após o nascimento do filho(a) deve ser manifestada 60 dias antes da data prevista para o parto e verificadas as devidas condições médicas, período obrigatório para qualquer pessoa que deseja passar por um procedimento de esterilização.

Em junho de 2023 a laqueadura e vasectomia passaram a constar na Tabela de Procedimentos disponíveis pelo Sistema Único de Saúde- SUS e o Ministério da Saúde divulgou a Nota Técnica nº 34/2023 com orientações a gestores estaduais, municipais e do Distrito Federal em relação a Lei nº 14.443, de 02 de setembro de 2022, que alterou a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996, sobre o Planejamento Familiar.

Porém mesmo apesar de todo esse amparo jurídico, os indivíduos candidatos a laqueadura e vasectomia, podem deparar-se com outro obstáculo, a recusa médica em realizar o procedimento, isso pode ocorrer porque de acordo com o Código de Ética Médica- Resolução nº 2.217/2018, modificada pelas Resoluções do Conselho Federal de Medicina- CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019, em seu Capítulo II, inciso IX- é direito do médico: “Recusar-se a realizar atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência .”

Na prática essa recusa, não retira do indivíduo o direito de realizar a laqueadura ou a vasectomia, apenas atrasa o processo, pois terá de encontrar outro médico que realize o procedimento, o que em tese poderia aumentar a fila dos candidatos a realizar a cirurgia pelo SUS.

Ademais é válido destacar que o tema abordado aqui está longe de ser esgotado, a palavra de ordem nesse sentido é o respeito, para que os cidadãos possam decidir sobre os seus corpos, para que a classe médica possa decidir em realizar ou não esses procedimentos para que o nosso país seja mais humanizado em relação ao planejamento familiar.

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