Juiz volta a cassar mandato do vereador Ney Santos em Embu das Artes

Por Sandra Pereira | 19/07/2013

O juiz eleitoral de Embu das Artes, Gustavo Sauaia Romero Fernandes, voltou a cassar o diploma do vereador de Embu das Artes Ney Santos, em sentença proferida no início da noite desta quinta-feira, 18. Além de determinar a cassação imediata do diploma do vereador o magistrado  decretou que Ney Santos fique inelegível por 8 anos. O juiz ainda aplicou multa ao vereador e a Ong Vida Feliz por conta de dois eventos realizados no período da campanha eleitoral.  A sentença do magistrado determina também a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de Ação Penal. A decisão tem efeito imediato e cabe recurso. 

A sentença do magistrado não trata sobre quem deverá ocupar a cadeira de Ney Santos e nem se haverá recontagem de votos na eleição de vereador como se comenta nos bastidores da política embuense. 

No dia 04 de julho o juiz cassou o mandato do vereador. Relembre aqui. Já no dia 11 acabou decretando nula a sentença de cassação. Veja aqui

O magistrado acatou denúncia de ligação do vereador com os atendimentos de saúde promovidos pela Ong Vida Feliz durante o período eleitoral de 2012. O juiz considerou que os atendimentos gratuitos ajudaram a “angariar a simpatia dos eleitores”. Também argumentou que o site do candidato continha material que comprovava o vínculo dele com a Ong. O magistrado aplicou multa ao vereador e a Ong, considerando o artigo 41 da Lei nº 9.504/97.

Ney Santos foi eleito com 8.026 votos, que o fizeram ser o vereador mais bem votado do Estado. A defesa dele diz que vai pedir o efeito suspensivo da sentença para que o vereador possa recorrer da decisão no cargo.  

Leia abaixo a íntegra da sentença do juiz Gustavo Sauaia Romero


Despacho
Sentença em 18/07/2013 - AIJE Nº 39235 Juiz GUSTAVO SAUAIA ROMERO FERNANDES

“Vistos. 

Nestes autos, volta-se a coligação representante contra a suposta ligação do representado com eventos de serviços médicos gratuitos promovidos pela ONG Vida Feliz, denominados “Ação Social A Saúde no seu Bairro”, incluindo consultas e exames médicos, bem como cortes de cabelo. Foram realizados eventos em12 de agosto de 2012 e 2 de setembro de 2012, no curso de campanha eleitoral das Eleições Municipais, nas quais o representado disputava o cargo de vereador, tendo sido eleito, diplomado e empossado. Os dois eventos foram alvo de diligências de constatação (fls. 47/54 e fls. 80/112) determinadas por este julgador, de modo cautelar. 

Citado, o representado apresentou defesa alegando perseguição política e negando vínculo com os eventos, destacando que em nenhum momento as diligências encontraram menção explícita a seu nome durante a realização, tampouco havendo fotografias provando o alegado. No mesmo sentido se deu a defesa apresentada pela ONG Vida Feliz. 

Por pedido das partes, neste Juízo Eleitoral e por Cartas Precatórias, foram ouvidas testemunhas. Não tendo as partes requerido novas provas, apresentou o Ministério Público parecer em favor da Procedência – fls. 418/429. 

Proferida sentença, foi esta objeto de embargos de declaração, em cuja apreciação foi anulado o sentenciamento, ao se constatar a inobservância do prazo para alegações finais das partes. Sanada a nulidade, apenas o representante apresentou suas alegações, tendo os demais protocolado novos embargos de declaração da sentença já anulada. 



Este é o relatório. Passa-se a fundamentar e decidir. 



Primeiramente, há que se observar que os embargos declaratórios apresentados pelos representados não apenas atentam contra a lógica, mas têm o mesmo objetivo do pedido de transcrição dos depoimentos por vídeo em fls. 499: protelar o feito. Não há o menor sentido em analisar supostas contradições e omissões de uma sentença que, por força dos próprios embargos contra a mesma, foi anulada e, portanto, não existe mais no mundo jurídico. Os demais pontos poderiam perfeitamente ter sido formulados nas alegações finais, pelas quais os representados protestaram. No lugar disso, apresentaram embargos declaratórios contra uma sentença inexistente. 

Não há, portanto, como interpretar tal petição como embargos, muito menos para concessão de efeito suspensivo. Para todos os efeitos, os supostos embargos devem ser recebidos como petições comuns, sem o condão de suspender o prazo único de alegações finais em favor dos representados. 

Também se observa que todas as questões levantadas naqueles embargos estão prejudicadas ou se mostram puramente de mérito. A eventual irregularidade nas intimações para prova oral se encontra preclusa, pois nada opuseram os representados na audiência una ou no prazo para diligências complementares. A partir de tal lapso, tem-se que os representados se dão, implicitamente, por satisfeitos com a prova colhida. 

Sobre a promotora que atuou no feito, é substituta do cargo para o qual foi delegada a designação eleitoral. Enquanto não preenchida a vaga por remoção ou promoção, o cargo segue cumulando a função eleitoral, a qual se estende à substituta. Destarte, não existiu qualquer ofensa ao Princípio do Promotor Natural. 

Mais intrigante é a súbita preocupação com a prova oral em vídeo, uma vez que os representados sequer se deram ao trabalho de assistir aos vídeos e constatar a qualidade dos mesmos. Não era necessário nem mesmo peticionar, bastando ter ido ao cartório para obtenção de cópia em CD, DVD ou pendrive. Não foi por outro motivo que o Mandado de Segurança, também claramente protelatório, teve pedido de liminar indeferido. 

No mérito, a considerar as tentativas de retardar o julgamento, já se inicia percebendo que nem os representados têm plena convicção de haverem agido dentro dos ditames legais, o que se confirma pela análise da prova documental. Primeiramente, esclarece-se que não é necessário, para configurar a captação de sufrágio, que os pedidos de votos sejam feitos durante o evento, até porque não se pode conceber que algum candidato seja desavisado o bastante para promover a infração eleitoral de forma tão descarada. Havendo elementos que permitam ao eleitor realizar a ligação entre a ONG Vida Feliz e o representado, tem-se suficiente motivo para configurar o ilícito. 

Neste ponto, há que se destacar os documentos de fls. 30/39: 

- fls. 30/31 – fotografias de faixa anunciando o evento da ONG Vida Feliz, incluindo a inscrição “Apoio – Ney Santos”; 

- fls. 33 – print de página do site do representado, CUJA AUTENTICIDADE É CERTIFICADA PELA SERVENTIA E NÃO É NEGADA EM DEFESA, com o tópico “Carreata do Projeto Saúde no seu Bairro atende na Chácara Maria Alice”; 

- Fls. 34 – print de arquivo de notícias do site do representado, CUJA AUTENTICIDADE É CERTIFICADA PELA SERVENTIA E NÃO É NEGADA EM DEFESA, com link intitulado “Carreata do Projeto Saúde no seu Bairro atende na Chácara Maria Alice”; 

- Fls. 35/39 – prints de notícias do site do representado, CUJA AUTENTICIDADE É CERTIFICADA PELA SERVENTIA E NÃO É NEGADA EM DEFESA, com fotografias e matéria intitulada “Carreata do Projeto Saúde no seu Bairro atende na Chácara Maria Alice”. Salienta-se que tal evento se deu já durante o período eleitoral, como indica a leitura do texto. 

Por tais documentos, fica caracterizado que, ainda que tal ONG não tenha ligação com o representado, este procurou se vincular ao evento como forma de angariar simpatia, e consequentemente votos, com os serviços gratuitos realizados nos eventos. Observa-se que todas as incursões das páginas se referem à campanha eleitoral do representado, de forma que as notícias sobre a ONG, ainda que sem conter o nome daquele, trazem a óbvia conexão entre a candidatura e os atos da organização. 

Contudo, nem são estas as provas mais gritantes da evidente relação entre os representados. Em fls. 216, informativo do candidato representado traz afirmação, pelo próprio, de que doaria seus vencimentos à ONG representada, caso eleito. Ou seja: o candidato representado procurou, de todas as formas, vincular-se aos atos beneficentes e gratuitos da ONG representada, a ponto de assumir a condição de financiador desta. Não é de admirar, por tal documento, que sua defesa tenha procurado se desviar da análise dos fatos. Todas as provas que comprometem seus clientes foram produzidas pelos próprios. 

É fato que as diligências nos eventos pouco ou nada serviram para encontrar alusões ao candidato representado durante, salvo a faixa cobrindo o caminhão, confirmada pela então chefe do Cartório desta Zona Eleitoral. Porém, tendo em vista que ninguém na diligência teve a presença de espírito de retirar a faixa para confirmar a suspeita, esta prova será desconsiderada, aplicando-se o benefício da dúvida em favor do representado. Todavia, ressalta-se novamente o que se colocou no início da análise: mesmo que os eventos não tenham mencionado o representado durante a execução, isto não afasta que os serviços realizados tenham sido ligados à campanha política, antes ou depois da execução dos eventos. 

Por tal análise global, ratifica-se a certeza de que a captação não se consumou no evento em si, mas na própria incursão em site, que antecedeu àquele. As provas documentais apresentadas, que constituem cópias de site do candidato representado e não foram negadas na defesa, deixam claro que aquele teve a intenção de se vincular ao evento e tirar proveito das benevolências promovidas. Se as incursões se deram no site e no impresso informativo da campanha, o objetivo só pode ter sido um: conseguir votos de quem se dirigiu aos eventos, por meio da associação do candidato ao realizador das vantagens gratuitas. 

Tem-se, assim, configuradas as elementares da captação de sufrágio. O dolo, consistente na intenção de receber votos com as vantagens entregues, encontra-se evidenciado na divulgação dos eventos pelo site do candidato representado, bem como na declaração de que este candidato doaria sua remuneração à representada. As vantagens entregues se confirmam pela realização do evento, independentemente de vinculadas ao candidato durante o momento de sua prestação. Tampouco resta dúvida de que os eventos foram realizados entre o registro da candidatura e a eleição. 

É de se lamentar que, em razão das dificuldades estruturais da Justiça Eleitoral, as provas orais só puderam ser colhidas após as eleições e, ademais, só se mostraram úteis para ratificar que houve o evento com prestação de serviços gratuitos. Contudo, não tinha este julgador outra escolha, uma vez que o posicionamento jurisprudencial é claro quanto à necessidade de proceder às oitivas, ainda que prescindíveis ao deslinde da causa pelo raciocínio do sentenciador. Procedimento contrário levaria fatalmente à nulidade da sentença. 

Ocorre que, como se sabe, a Investigação Eleitoral não é tida como prejudicada pela diplomação, ou mesmo pela posse. Como deixa claro o artigo 41-A da Lei nº 9504/97, também pode ser cassado o diploma do representado, não havendo disposição indicando que a posse encerra a questão. Pelo contrário, pois tal posse é que se torna ineficaz pelo advento da cassação do diploma, ainda que posterior. Apenas, por segurança jurídica, devem se dar como válidos os atos praticados pelo representado no tempo em que esteve regularmente empossado no cargo. Não apenas o representado, como também os outros diplomados por meio do quociente eleitoral decorrente da votação daquele. 

No que tange à ONG Vida Feliz, também representada, esta tampouco deve ser agraciada pelo benefício da dúvida, pois não veio a questionar as fotografias de fls. 30/31, de faixas atribuídas a ela indicando o apoio do representado à iniciativa. Tal evidência, ainda que reduzida, é bastante para constatar que partiu da representada, igualmente, o intuito de se relacionar com o nome do representado em seu evento. 

Dadas as responsabilidades de ambos os representados, é certo que devem ser condenados a multa, a qual se fixa no dobro do valor mínimo legal, tendo em vista a quantidade de eventos – dois. Quanto ao representado Claudinei Alves dos Santos, ainda caberá a medida drástica prevista no artigo 41-A da Lei nº 9504/97, sem prejuízo das consequências penais de suas condutas. 

Por fim, tendo em vista a notória repercussão que o julgamento tende a produzir no eleitorado de Embu das Artes, espera-se que esta decisão sirva para que o eleitor reflita sobre sua própria forma de escolher seus eleitos, pois tais expedientes só ocorrem porque ainda há quem aliene sua consciência por vantagens pessoais. Enquanto a política tiver favores à frente de ideias e compromissos, sair às ruas não será mais que um Carnaval fora de época. 

Desta forma, sem mais delongas, julga-se PROCEDENTE a Representação com Investigação Eleitoral, de modo a: 

- cassar o diploma, a partir desta data, do vereador eleito Claudinei Alves dos Santos, vulgo Ney Santos, qualificado nos autos, bem como condená-lo ao pagamento de multa no dobro do valor mínimo previsto no 41-A da Lei nº 9504/97; 

- declarar inelegível, pelo período de oito anos, o representado Claudinei Alves dos Santos, vulgo Ney Santos, qualificado nos autos, com fundamento no artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/90; 

- com fundamento no mesmo dispositivo, determinar a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de Ação Penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comporta; 

- condenar a Organização Não Governamental Vida Feliz ao pagamento de multa no dobro do valor mínimo previsto no 41-A da Lei nº 9504/97. Deixa-se de aplicar as penas de inelegibilidade em virtude de a prova contra a representada não permitir que se identifique qual dos dirigentes procedeu à menção do candidato representado, de modo que não se denota razoável medida tão drástica. 

Esta decisão tem vigência imediata, ante o disposto no artigo 257 do Código Eleitoral. Providencie-se o necessário. 

P.R.I.C. 

Embu das Artes, 18 de julho de 2013 

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